quinta-feira, 19 de junho de 2008

A Mário de Andrade de Ausente - Manuel Bandeira

"Anunciaram que você morreu.

Meus olhos, meus ouvidos testemunham:

A alma profunda, não.

Por isso não sinto agora a sua falta.

Sei bem que ela virá (Pela fôrça persuasiva do tempo).

Virá súbito um dia,

Inadvertida para os demais

Por exemplo assim:

À mesa conversarão de uma coisa e outra

Uma palavra lançada à toa

Baterá na franja dos lutos de sangue.

Alguem perguntará em que estou pensando,

Sorrirei sem dizer que em você,

Profundamente.

Mas agora não sinto a sua falta.

É sempre assim quando o ausente Partiu sem se despedir:

(Você não se despediu.)

Você não morreu: ausentou-se.

Direi: Faz tempo que êle não escreve.

Irei a São Paulo: você não virá no meu hotel.

Imaginarei: Está na chacrinha de São Roque.

Saberei que não, você ausentou-se.

Para outra vida?

A vida é uma só. A sua vida continua

Na vida que você viveu.

Por isso não sinto agora sua falta."

1945

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